José Mojica Marins
(São Paulo/SP, 13 de março de 1936)
(São Paulo/SP, 19 de fevereiro de 2020).
José Mojica Marins foi um cineasta, ator e roteirista de cinema e televisão brasileiro mais conhecido como (Zé do Caixão), seu personagem mais famoso. Mojica é considerado o "pai" do terror nacional, tendo sua obra grande importância para o gênero, influenciando várias gerações. Embora Mojica seja conhecido principalmente como diretor de cinema de terror, ele fez trabalhos anteriores cujos gêneros variavam entre faroestes, dramas e aventuras, entre outros, incluindo filmes do gênero pornochanchada. Nascido em uma fazenda pertencente à fábrica de cigarros “Caruso”, na Vila Mariana, em São Paulo, José Mojica Marins é filho dos artistas circenses Antônio André e Carmen Marins, primo de Fernando Marins e neto do espanhol José Marins que chegou ao Brasil no começo do século vinte. Seu tio Miguel (também filho de José Marins) foi toureiro enquanto o avô, José Marins, fazia performance de toureiro vestido de palhaço no picadeiro. José Mojica Marins ainda criança, passava horas lendo gibis, assistindo filmes na sala de projeção do cinema em que seu pai trabalhava, brincava de teatro de bonecos e montava peças com fantasias feitas de papelão e tecido. Quando tinha três anos, a família de Mojica se mudou para os fundos de um cinema na Vila Anastácio. O pai de Mojica passou a ser gerente do cinema. Depois que ganhou uma Câmera V-8, aos doze anos, Mojica não parou mais de fazer cinema. Muitos de seus filmes artesanais feitos na época eram exibidos em cidades pequenas, cobrindo assim os custos de produção. Autodidata, montou uma escola de interpretação para amigos e vizinhos e quando tinha dezessete anos, depois de vários filmes amadores, fundou, com ajuda de amigos, a “Companhia Cinematográfica Atlas”. Especializado em terror escatológico, criou uma escola de atores, onde na década seguinte, montaria uma sinagoga no bairro de Brás, onde fazia experiências com atores amadores, usando insetos para medir sua coragem. Depois da fundação da escola, a carreira profissional de Mojica passou a ficar cada mais mais próxima. Mojica tentou realizar o filme “Sentença de Deus” por três vezes e o filme ficou inacabado. Semi profissional, o filme “Sentença de Deus” é experimental no sentido mais genuíno e revela os primeiros passos de José Mojica Marins na arte do cinema. “A Sina do Aventureiro” veio ser concluído em lente 75 mm, com apenas duas pessoas que não eram da escola de atores de Mojica, mas que depois vieram a ter aulas, Ruth Ferreira e Shirley Alvez. “A Sina do Aventureiro” é um faroeste caboclo (ou “western feijoada”, na definição do pesquisador Rodrigo Pereira), vertente prolífica, mas desprezada pela historiografia clássica do cinema brasileiro. Insere-se, portanto, na tradição mais ampla dos filmes rurais de aventura, território que compreende nomes tão heterogêneos quanto significativos como E. C. Kerrigan, Amilar Alves, Luiz de Barros, Humberto Mauro, Eurides Ramos, Antoninho Hossri, Victor Lima Barreto, Carlos Coimbra, Wilson Silva, Osvaldo de Oliveira, Reynaldo Paes de Barros, Edward Freund, Ozualdo Candeias, Tony Vieira e Rubens Prado. Para lançar o filme “A Sina do Aventureiro”, Mojica contou com a ajuda dos irmãos Valancy, que eram proprietários do “Cine Coral” em São Paulo, onde o filme permaneceu em cartaz por muito tempo. Depois de aceitar a proposta de Augusto de Cervantes para fazer um filme que agradasse aos padres, que não tinham gostado nada de “A Sina do Aventureiro”, Mojica criou a história de “Meu Destino Em Tuas Mãos” e procurou Ozualdo Candeias para fazer o roteiro (não foi creditado). As tragédias familiares são apresentadas pelo cineasta com requintes de maldade, temperados por aquele neorrealismo involuntário das produções sem dinheiro. A direção de Mojica deixou o filme ainda mais cru e violento. O filme conta o drama de cinco crianças pobres que vivem infelizes com suas respectivas famílias. Cansados de abuso e desprezo, os amigos fogem de casa e saem pelas estradas, acompanhados do violão e da cantoria de (Carlito), vivido por Franquito, o mais velho deles. O jovem Franquito, o “garoto da voz de ouro”, foi uma aposta para embarcar no estrondoso sucesso de Pablito Calvo, astro-mirim de “Marcelino, Pão e Vinho”. Mojica compôs três das dez canções interpretadas por Franquito. “Meu Destino Em Tuas Mãos” foi realizado com o dinheiro da venda dos LPs de Franquito, hoje uma raridade por ser um dos primeiros filmes a ter disco com todas as músicas lançado pela gravadora “Copacabana”. O filme, apesar de ter agradado aos padres, não teve repercussão nenhuma e acabou esquecido. Algum tempo depois, o produtor Nélson Teixeira Mendes contratou Mojica para ser ator em “O Diabo de Vila Velha”, um bang-bang. Como condição, Mojica pediu para poder levar o pai, que estava muito doente, para o Paraná, onde o filme ia ser feito. Após muitas discussões com o diretor Ody Fraga, este veio a se afastar e Mojica assumiu a direção do filme, onde demonstrou afinidade com o gênero faroeste, que já havia exercitado em “A Sina do Aventureiro” e ao qual voltaria em “D’Gajão Mata Para Vingar”. Mojica criou um personagem popular sem se basear em nenhum mito do horror conhecido mundialmente. (Zé do Caixão), seu personagem mais conhecido, foi criado por ele após ser atormentado por um pesadelo no qual um vulto o arrastava até seu próprio túmulo. Segundo o próprio José Mojica Marins, o nome (Zé do Caixão) veio de uma lenda de um ser que viveu há milhões de anos no planeta Terra que se transformou em luz e depois de anos esta luz voltou a Terra. A primeira aparição do personagem foi no filme “À Meia-Noite Levarei Sua Alma”. Desde então, ele apareceu em diversos filmes, ganhou popularidade e tem sido retratado em diversas outras mídias. Embora raramente mencionada nos filmes, o nome verdadeiro (Zé do Caixão) é (Josefel Zanatas). (Zé do Caixão) é um personagem amoral e niilista que se considera superior aos outros e os explora para atender seus objetivos. (Zé do Caixão) é um descrente obsessivo, um personagem humano, que não crê em Deus ou no Diabo. O cruel e sádico agente funerário (Zé do Caixão) é temido e odiado pelos habitantes da cidade onde mora. O tema principal da saga do personagem é sua obsessão pela continuidade do sangue: ele quer ser o pai da criança superior a partir da "mulher perfeita". Sua ideia de uma mulher "perfeita" não é exatamente físico, mas alguém que ele considere intelectualmente superior à média e nessa busca ele está disposto a matar quem cruza seu caminho. Quanto à concepção visual do (Zé do Caixão) fica evidente a inspiração do personagem clássico (Drácula), interpretado por Bela Lugosi. Entretanto, Mojica acrescentou aos trajes negros e elegantes do personagem características psicológicas profundas e enraizadas nas tradições brasileiras. Além disso, as unhas grandes foram claramente inspiradas no personagem-título de “Nosferatu, Eine Symphonie des Grauens”. Mojica afirmava que a ideia do personagem surgiu em um sonho. Por falta de um ator, pois não havia nenhum que se submetesse à caracterização do personagem, o autor se transformou em (Zé do Caixão). Mojica, na época, estava de barba, por causa de uma promessa de família. Com o tempo o nome do personagem passou a se confundir com o do próprio autor e lhe trouxe praticamente toda sua fama. Com dificuldade, pois os atores não confiavam e nem acreditavam em Mojica, ele realizou as filmagens de “À Meia Noite Levarei Sua Alma”, apenas com atores de sua escola de teatro. O filme marca a maturidade de José Mojica Marins como diretor, que se relaciona perfeitamente com o domínio da linguagem cinematográfica. Em “À Meia Noite Levarei Sua Alma” há todo um requintado trabalho de construção de espaços diferenciados para (Zé do Caixão) e esse é o modo como o filme logra distinguir este personagem dos outros. Após a etapa de montagem com Luiz Elias. (Zé do Caixão) tem uma filha chamada (Liz Vamp). Mojica iria atrás do distribuidor da Bahia que havia levado “A Sina do Aventureiro” e que estava em São Paulo e havia ido à "Boca do Lixo". Após assistir o filme montado, o distribuidor passou a divulgá-lo como um grande sucesso. Na mesma época, Mojica relançou “A Sina do Aventureiro” e teve um retorno lucrativo grande. Ele havia feito amizade com um cineasta cubano que realizava filmes pornográficos e pediu a Mojica que acrescentasse mais dez minutos de cenas mais fortes e Mojica colocou algumas cenas de nudez. O filme foi vendido por cerca de vinte por cento do que havia sido gasto. O cineasta paulistano José Mojica Marins, deixa, como diretor, uma obra com os títulos “A Mágica do Mágico”, “Beijos a Granel”, “Sonhos de Vagabundo”, “A Voz do Coveiro”, “Sentença de Deus” (inacabado), “A Sina do Aventureiro”, “Meu Destino Em Tuas Mãos”, “À Meia-Noite Levarei Sua Alma”, “O Diabo de Vila Velha”, “Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver”, “O Estranho Mundo de Zé do Caixão”, “Trilogia do Terror”, “O Despertar da Besta”, “Finis Hominis”, “D’Gajão Mata Para Vingar”, “Quando os Deuses Adormecem”, “Sexo e Sangue na Trilha do Tesouro”, “A Virgem e o Machão”, “Exorcismo Negro”, “O Fracasso de Um Homem nas Duas Noites de Núpcias”, “Como Consolar Viúvas”, “Inferno Carnal”, “Mulheres do Sexo Violento”, “A Mulher Que Põe a Pomba no Ar”, “Delírios de Um Anormal”, “A Estranha Hospedaria dos Prazeres”, “Mundo-Mercado do Sexo”, “Perversão”, “A Praga”, “A Encarnação do Demônio”, “Horas Fatais - Cabeças Cortadas (Horas Fatais)”, “A Quinta Dimensão do Sexo”, “24 Horas de Sexo Explícito”, “Dr. Frank na Clínica das Taras”, “48 Horas de Sexo Alucinante”, “Demônios e Maravilhas”, “Adolescência em Transe”, “Fim” (curta metragem), “Encarnação do Demônio” e “As Fábulas Negras - Segmento O Saci” e como ator sua imagem registrada em curtas-metragem, longas metragem, séries e documentários com os títulos “Éramos Irmãos”, “O Diabo de Vila Velha”, “O Cangaceiro Sem Deus”, “O Profeta da Fome”, “A Estranha Hospedaria dos Prazeres”, “O Abismo“, “O Vampiro da Cinemateca”, “A Deusa de Mármore”, “Chapeuzinho Vermelho”, “O Segredo da Múmia”, “Padre Pedro e a Revolta das Crianças”, “O Filho do Sexo Explícito”, “A Hora do Medo”, “As Belas da Billings”, “Horas Fatais”, “Dama de Paus”, “O Gato de Botas Extraterrestre”, “Babu e a Vingança Maldita”, “Ed Mort”, “A Filha do Pavor”, “Dr. Bartolomeu e a Clínica do Sexo”, “Tortura Selvagem - A Grade”, “Um Show de Verão”, “Lâmia, Vampiro!”, “A Marca do Terror”, “A Cruz e o Pentagrama”, “Carniçal”, “Mal Passado” e “As Fábulas Negras - Segmento O Saci”. Mojica desenvolveu um estilo próprio de filmar que inicialmente desprezado pela crítica nacional, passou a ser reverenciado após seus filmes começarem a ser considerados cult no circuito internacional. Mojica é considerado como um dos inspiradores do movimento marginal no Brasil. Em todos seus filmes, com exceção de “Encarnação do Demônio”, José Mojica Marins foi dublado. Na época, muitos filmes nacionais necessitavam de dublagem, por diversas razões: nitidez de som nas externas ou até para realçar uma melhor interpretação. Algumas vezes o próprio ator dublava o seu personagem, mas em outras ocasiões necessitava de um profissional qualificado para um melhor desempenho. Mojica ficou particularmente impressionado com a voz usada para dublar o ator italiano Mario Carotenuto: a voz de Laercio Laurelli. Laurelli fez a voz de (Zé do Caixão) em “À Meia-Noite Levarei Sua Alma”, “Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver” e “O Estranho Mundo de Zé do Caixão”; enquanto “O Ritual dos Sádicos”, “Finis Hominis” e “Quando os Deuses Adormecem” foram dublados por Araken Saldanha, já “Exorcismo Negro” e “Delírios de um Anormal” tiveram a voz de João Paulo Ramalho. Mojica apresentou, na TV Bandeirantes, o programa “Cine Trash” que obteve alta audiência. As apresentações macabras do (Zé do Caixão) se tornaram um marco na televisão. Mojica teve seus títulos lançados na Europa e nos Estados Unidos, onde participou de mostras, festivais e recebeu prêmios. No Brasil, Mojica não conseguiu o mesmo sucesso e reconhecimento. Existem poucos títulos de seus filmes disponíveis no mercado, o que tornou sua obra pouco conhecida. Sua participação na mídia se dá quase sempre de maneira cômica, fato que teve que abraçar por necessidades financeiras. O Canal Brasil exibiu por muito tempo um programa de entrevistas chamado “O Estranho Mundo de Zé do Caixão”. Mojica interpretou um personagem diferente no longa-metragem “A Cruz e o Pentagrama” de Cesar Nero, em vez de (Zé do Caixão), o nome de seu personagem era (Dark Morton), porém o visual do personagem era o mesmo de (Zé do Caixão), com a tradicional cartola e capa preta. No Carnaval Carioca de 2011, José Mojica Marins o (Zé do Caixão) foi homenageado e participou do desfile vice-campeão da ”Escola Unidos da Tijuca”. Mojica prefaciou o livro "3355 - Situações Que Você Deve Saber Para Não Morrer Como Nos Filmes de Terror” do escritor Gerson Couto. Mojica também aparece na capa do disco “Expulsos do Purgatório”, curiosamente no décimo terceiro ano da lendária banda punk “Excomungados”. Está também nos encartes juntamente com os integrantes. O vocalista Pekinez Garcia, que toca nu inspirado no personagem principal do filme “Finis Hominis” já foi internado duas vezes em hospícios e segundo uma lenda urbana ele teria sido amaldiçoado pelo (Zé do Caixão). José Mojica Marins ficou por quase um mês internado no InCor, em São Paulo, onde passou por um cateterismo cardíaco planejado e desobstrução de uma artéria que estava com bloqueio. Na ocasião, ele foi submetido a uma angioplastia, procedimento para desobstruir vasos entupidos, e colocou três stents (tubo inserido para normalizar a passagem de sangue dentro da artéria). Por conta disso, o intérprete de (Zé do Caixão) passou a fazer diálises (filtragem do sangue) três vezes por semana. O canal por assinatura Space fez uma minissérie biográfica sobre Mojica intitulada “Zé do Caixão”. Na produção o cineasta foi interpretado pelo ator Matheus Nachtergaele. Mojica foi homenageado no programa “Domingo Show” da TV Record. Na homenagem o ator aparece muito debilitado, apresentando um suposto quadro de Alzheimer. José Mojica Marins estava internado e morreu vítima de uma broncopneumonia. A morte foi confirmada pela filha, a atriz Liz Marins.